Na prática, há terceirizações que desrespeitam e outras que respeitam. Para mudar esse quadro, o Brasil precisa de uma lei que induza ao respeito.
Apesar de reconhecer que a legislação, sozinha, não garante a boa terceirização, este artigo apresenta duas sugestões para se cunhar uma lei que dê segurança jurídica às empresas e proteções aos trabalhadores.
Atualmente, o único expediente sobre o assunto é a Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que autoriza a terceirização de atividades-meio e proíbe a terceirização de atividades-fim.
E aqui começa a confusão. O que é meio e o que é fim? Na prática, é impossível fazer essa distinção. Por isso alguns juízes acham que a atividade "A" é meio, enquanto outros acham que é fim, o que gera insegurança jurídica.
Por exemplo, em junho de 2007 a Justiça do Trabalho condenou a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) a incorporar a seu quadro de pessoal os terceirizados que trabalhavam em empresas contratadas para realizar obras de extensão de rede elétrica, manutenção de iluminação pública, instalação de medidores e outras atividades consideradas como fim, o que, na prática, acabará com a terceirização naquela empresa.
O que interessa na terceirização não é a esgrima entre meio e fim, e sim a proteção de todos os que participam da produção como empregados da contratante e das contratadas ou como profissionais autônomos, cooperados, teletrabalhadores, etc.
Teoricamente, a terceirização gera ganhos de especialização, qualidade, agilidade, simplificação, desburocratização, avanço tecnológico, uso racional do tempo, rateio de riscos, redução de custos e tudo o que contribui para a produtividade, o lucro, os investimentos e os empregos.
Mas nem sempre é assim. Por isso há empresas que terceirizam; há as que não terceirizam; e há as que desterceirizam. Essa decisão é das empresas. Trata-se de uma decisão complexa e que não pode ser administrada por juízes que, por estarem longe do mundo da produção, ora julgam de um jeito, ora de outro. O que interessa, repetindo, não é autorizar esta e proibir aquela atividade, mas sim garantir proteções para todos os que integram a produção.
O primeiro passo para se chegar a uma lei de boa qualidade é acabar com a divisão artificial entre meio e fim. O segundo é criar um mecanismo que leve as contratantes a ajudar a assegurar o cumprimento das leis de proteção.
Um dos modos de fazer isso é responsabilizar as empresas contratantes pela contratação de empresas idôneas e pelo acompanhamento de suas condutas ao longo do contrato de terceirização. Como fazer esse tipo de monitoramento sem criar muita burocracia? Aqui vai uma sugestão.
Para as contratantes que seguirem as regras do referido monitoramento, a sua responsabilidade seria subsidiária. Caso contrário, seria solidária. Como subsidiárias, elas responderiam por eventuais desvios no caso de fracasso das contratadas. Como solidárias, elas responderiam sempre pelos desvios, independentemente do que ocorre com as contratadas. Trata-se de uma forte elevação do risco para quem optar pelo comodismo.
Vejamos um exemplo. Hoje em dia, as grandes grifes de confecções (Giorgio Armani, Lacoste ou Hugo Boss) se concentram na atividade de criação e subcontratam todas as demais atividades com empresas e autônomos que executam o corte, a costura, o acabamento, a embalagem e a entrega do produto final nas lojas. Trata-se de uma verdadeira constelação de contratos e relacionamentos que englobam vários tipos de atividades. O mesmo ocorre com os que, como contratados, executam a soldagem, a pintura, a eletricidade e o estofamento nas montadoras de automóveis.
Nessa cadeia de contratantes e contratadas, as que seguirem as regras acima teriam responsabilidade subsidiária. As demais cairiam na solidária. Com essa elevação do risco de punição, as contratantes seriam induzidas a fazer o necessário monitoramento, transformando-se em verdadeiros fiscais na supervisão do cumprimento das proteções dos trabalhadores. É apenas um exemplo de medida que pode nos levar a uma terceirização decente, simples e eficaz.
O Estado de S. Paulo, 13/11/2007
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