"Os Educadores-sonhadores jamais desistem de suas sementes,mesmo que não germinem no tempo certo...Mesmo que pareçam frágeisl frente às intempéries...Mesmo que não sejam viçosas e que não exalem o perfume que se espera delas.O espírito de um meste nunca se deixa abater pelas dificuldades. Ao contrário, esses educadores entendem experiências difíceis com desafios a serem vencidos. Aos velhos e jovens professores,aos mestres de todos os tempos que foram agraciados pelos céus por essa missão tão digna e feliz.Ser professor é um privilégio. Ser professor é semear em terreno sempre fértil e se encantar com acolheita. Ser professor é ser condutor de almas e de sonhos, é lapidar diamantes"(Gabriel Chalita)

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sábado, 13 de dezembro de 2008

Escritos do passado...Anísio Teixeira, 1957


Rio, maio 57

Meu caro Rubem Braga: a sua palavra é hoje tão lida, que fiquei com pena de ver, em meio à sua crônica tão humana sobre as Crianças, lançar você uma porção de dúvidas sobre duas idéias que me são caras para a feliz orientação do problema escolar brasileiro: a escola local, regional e não "consular", "metropolitana", em rigor "colonizadora" e a escola completa, rica, variada, com tempo suficiente para se constituir vida e formação da criança...Se lhe sobrasse tempo para ler coisas ainda mais fastidiosas do que "Educação não é privilégio", teria podido ver que essa escola de tempo integral não é a escola do campo mas a da cidade... e, sobretudo, a da cidade moderna, onde a criança já não poderá ter nenhuma experiência integrada e harmoniosa senão na escola, todos os seus outros espaços vitais - o do apartamento, o da rua, o do clube, o do cinema - sendo parciais, fragmentários e contraditórios... No campo, seria o contrário: a escola poderia ser de tempo parcial, como pensa você, pois a grande e boa educação da criança já se faz pela sua vida simples, mas, integrada, responsável, construtiva e, sobretudo, incrivelmente digna, pelo trabalho e pelas relações humanas diretas, sérias e completas... Ah! meu caro Rubem, se soubesse quanto penso como você em relação à nossa criança rural! Vou tão longe que as dúvidas que me assaltam são maiores que as suas. Duvido que lhes convenha a própria escola de letras. E não nos sendo possível dar-lhes a escola de trabalho e de enriquecimento de sua própria cultura, pois essa escola exigiria professores de grande preparo e muito dinheiro, chego a achar que melhor seria não lhes dar escola nenhuma. Como isto não é possível, defendo para o campo uma escola modesta, de quatro anos de estudo, e que, ainda assim, mais preparará os alunos para poderem deixar o campo do que para ficar...A escola que possuímos é uma escola para o tipo de civilização urbana, só aplicável ao campo na medida em que ele se urbaniza, reurbaniza, dizem hoje, os sociólogos. Como isto, de fato, acabará por se dar, em todo país, a escola deverá organizar-se tão bem quanto possível nas cidades e ir se estendendo pelo campo na sua missão de lhes transformar também gradualmente a vida...Já que a escola é, assim, um instrumento de transformação, ou, pelo menos, de consolidação da transformação da civilização rural em civilização urbana, afim de que sua influência não seja exageradamente alienadora , defendo a idéia de fazê-la local e regional. De modo que o meu localismo escolar vai ao encontro de sua dúvida sobre a escola conveniente ao próprio campo. Municipal e local ela se integrará melhor nos defeitos e qualidades do meio, moderando, desse modo, a sua ação naturalmente desenraizadora. A cultura escolar primeiro desenraíza para depois - hélas! só muito depois - plantar de novo e enraizar-nos na humanidade, dessa forma ampla, completa e universal, de que você é um alto e grande exemplo. Daí o nosso cuidado de educadores em acentuar os traços locais e regionais da escola, afim de lhe corrigir a tendência, por assim dizer, congênita de segregar, separar, alienar...Sabe você, meu caro Rubem, quanto é difícil pensar claro em nosso país. Como o nosso progresso se fez por acaso, julgamos poder continuar a progredir por acaso. A realidade, porém, não é que progredimos por acaso mas que progredimos, até ontem, lentamente e o progresso lento toma conta se si mesmo e acaba por se harmonizar. Mas, o progresso rápido de hoje não tem tempo para esse reajustamento. Todo progresso é um tumulto e uma deslocação e se se faz muito acelerado destrói mais do que constrói e daí ser necessário um reforço substancial na quantidade de educação do indivíduo par suportá-lo e corrigi-lo.A escola primária da Suíça - um modesto e grande exemplo de civilização estável em meio ao tumulto do mundo moderno - impõe à criança onze mil horas de atividades intencionalmente educativas, a americana, sete mil horas, a melhor escola primária brasileira, aos que a freqüentam integralmente, dá-lhes duas mil e quatrocentas horas!... Por mais gênios que sejamos nós brasileiros, por força que há de sobrar alguma diferença entre nós e os suíços. Grande parte dessa diferença será divertida senão boa mas o restante há que ajudar a mudar... Seu de sempre

Anísio


TEIXEIRA, Anísio. Carta a Rubem Braga, [Rio de Janeiro?], maio 57.Localização do documento: Fundação Getúlio Vargas/CPDOC - Arquivo Anísio Teixeira - ATc 57.05.00.

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