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quarta-feira, 28 de novembro de 2007
A importância do professor
sexta-feira, 23 de novembro de 2007
A vida como ela é
Gabriel Chalita
Não celebramos os clássicos por acaso. Eles nos ensinam métodos de composição literária, refletem um momento dentro do tempo, mostram a cultura, costumes, movimentos sociais, estética dominante. Foi assim com o Romantismo, por exemplo, uma das mais fortes e produtivas correntes literárias. E foi assim também com o Realismo, que veio em seguida para trazer a obra literária para mais perto da realidade. Exagerou na crueza das situações e na nudez das descrições. Mas, em literatura, como na vida, parece certo que o meio-termo é que é o termo certo. E surgiu, nos dias de hoje, uma nova maneira de contar histórias, mesclando o descritivo e o analítico com o subjetivo e o emocional. É uma literatura mais cotidiana, mais a vida como ela é, como queria Nelson Rodrigues. A vida não é novela, mas um mestre da televisão pode tornar uma novela tão expressiva quanto a própria vida. Esse mestre é Walcyr Carrasco, que nos dá a surpresa de trazer à luz "A palavra não dita".
O livro de Walcyr é uma história sincera. Com toda a honestidade, o autor faz com que os personagens interajam, e não lhes esconde os sentimentos. Essa franqueza perpassa o relato inteiro, e as pessoas retratadas revelam suas almas, com as purezas, mesquinharias, temores e anseios que habitam todas as almas. Gente, sem os disfarces românticos ou os exageros realistas. São pessoas, encontrando-se e desencontrando-se. E, por isso mesmo, é a boa literatura, moderna e forte.
Moderna porque trata, do ponto de vista do conteúdo, de temas atuais, observados pelo olhar do jornalista que se acostumou a observar a vida social, a participar e até a alterar o seu rumo. Do ponto de vista da linguagem, é simples e direta, com traços de coloquialidade que trazem à tona os aspectos tribais presentes nos diferentes grupamentos. A naturalidade com que o paulista Walcyr Carrasco trata do linguajar do povo gaúcho, em especial dos jovens de Porto Alegre, revela uma boa pesquisa e um excelente espírito de observação.
Forte porque aborda corajosamente um tema relegado ao noticiário do chamado "mundo cão", e o faz com naturalidade, respeito, e principalmente honestidade.
Lá dentro, na trama narrativa, Walcyr Carrasco vai usando alguns artifícios. Um deles é o de explicar, como se fosse casualmente, termos, vocábulos e situações, com um propósito didático, mas que não soa como aula. E vai buscar apoio na própria linguagem dos jovens, para que tudo seja explicado para o jovem leitor na sua própria forma de comunicação. Coisa de escritor sensível ao mundo que o rodeia.
Mas é o conjunto de valores expressos na narrativa o que dá ao livro o peso pedagógico e que lhe dá motivo para ser comentado neste espaço.
A história de Walcyr Carrasco fala de sinceridade. De honestidade. De lealdade. As más ações contadas no livro não resultam em geral de má índole dos personagens, mas de contingências e circunstâncias. Porque o mundo é assim mesmo. As pessoas não fazem o mal, normalmente, para prejudicar, mas porque escolheram motivos e atitudes erradas diante da vida. O livro fala também que não se deve julgar as pessoas com base em idéias pré-concebidas. Cibele, a personagem principal, narradora, vai aprender isto a todo momento.
Por essas razões é que venho recomendar aos professores que trabalhem em sala o livro "A palavra não dita", de Walcyr Carrasco. Evidentemente os professores terão que destacar e corrigir dois ou três erros de revisão - coisa rara numa editora séria como a Moderna, mas que não comprometem a qualidade geral do livro. É claro também que os professores não deverão abandonar os clássicos, mas uma leitura como esta, complementarmente, ajuda a entender o mundo. O mundo como ele é.
Revista Profissão Mestre, outubro/2007
Ética passada a limpo
Protágoras, pensador grego que viveu entre 487 e 420 antes de Cristo, achava que ética era uma coisa empírica. Cada pessoa, segundo ele, adotaria a conduta mais conveniente à sua própria escala de valores. Para o pensador, o certo e o errado deveriam ser avaliados em função das necessidades do homem, e, portanto, os critérios de avaliação variariam de sujeito para sujeito. Posição parecida, mas ampliada, adotaram dois sociólogos franceses, Durkheim e Bouglé, no século 19, que consideravam que os valores éticos (o certo, bom, justo, verdadeiro) são obtidos por apreciação coletiva, e, portanto, variam conforme o grupo focalizado.
Mas antes deles alguém definiu, com mais precisão, o sentido da palavra ética. Foi Aristóteles, que afirmava existir um valor supremo, que norteia a vida das sociedades. Esse valor é a felicidade. Felicidade, em grego, é a junção de eu (bom) e demonia (espírito). A corrente foi enriquecida, mais tarde, por outros filósofos que consideravam que a felicidade era o fim, o objetivo, e que a virtude era o meio, a ferramenta, para se alcançar a felicidade.
No meu livro Os dez mandamentos da ética, faço uma reflexão sobre a genial obra "Ética a Nicômaco", de Aristóteles. Apresento os passos para que a ética seja vivenciada.
O primeiro é fazer o bem.
O segundo é agir com moderação, buscando o equilíbrio, eliminando os excessos.
O terceiro é saber escolher, e aí está implícito o favor de subjetividade que é preciso existir em cada conceito, porque cada ser humano é diferente do outro, e carrega sua experiência, sua cultura, que o torna único. A questão, envolvida na escolha, é que a decisão, para ser boa, precisa levar em conta, necessariamente, os dois passos anteriores: fazer o bem e agir com moderação.
O quarto passo é praticar as virtudes. Uma atitude essencial, porque não basta fazer o bem, agir com moderação e saber escolher, se a pessoa não se dedicar a praticar os valores que adquiriu.
Com isso, o quinto passo é praticamente automático: viver a justiça. Quem segue os quatro primeiros passos aprende, incorpora o sentido de fazer as boas coisas olhando para o outro e para as necessidades do outro, sem esquecer de si mesmo. Isto é a base da justiça.
O sexto passo é valer-se da razão, ou seja, da consciência, do pensamento analítico. Está intimamente ligado ao sétimo passo, que é valer-se do coração. Duas orientações que se complementam: a pessoa deve usar uma balança em que se equilibrem, com peso equivalente, o racional e o emocional. As chances de que as escolhas sejam acertadas, agindo assim, são grandes.
O oitavo passo é ser amigo. Quem é amigo aplica todos os conceitos que acabamos de ver, sem dificuldade.
O nono passo (cultivar o amor) é quase um corolário para o décimo (ser feliz).
Aí está, portanto, um rosário de recomendações que retira o aspecto generalista dos conceitos que historicamente acompanham as discussões sobre ética. Norberto Bobbio, um dos grandes pensadores contemporâneos, por exemplo, aponta a honestidade como uma virtude válida para todos os homens, mas que, ao mesmo tempo, é uma atitude unida à conduta correta de uma pessoa no exercício da sua profissão. Ou seja, o homem tem que ser honesto, mas o médico também tem que ser um profissional honesto. É isso o que se diz nas ruas e em todos os lugares.
Este tema é fundamental na escola. Um dos tantos objetivos da educação é ensinar a conviver. E o convívio significa respeito, cooperação, ternura, enfim. E isso é a ética. A ética se aprende nos livros, nas lições dos grandes mestres. E se aprende no cotidiano, no exercício de ser correto.
Bom seria se os pais dessem o exemplo primeiro. Os filhos precisam de referências. Que os políticos e as pessoas de alguma visibilidade também se preocupassem em viver de maneira correta e que na escola professores e alunos interagissem de modo a construir relações éticas que gerassem um clima de confraternização e cooperação. E esse aluno-cidadão será um profissional-cidadão. E portanto ético e portanto feliz.
Aliás, esse é o conceito já presente em Aristóteles: nascemos para ser felizes e para fazer os outros felizes. Isto é a ética.
Qual a melhor escola para o meu filho?
A educação é o grande legado que os pais deixam para os seus filhos. Foi o que disse, com grande perspicácia, a autora dos sublimes Poemas dos Becos de Goiás, Cora Coralina, numa frase inspirada: Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina. Disse isto, segundo Olympia Salete Rodrigues, uma de suas biógrafas, quando tinha já o rosto enrugado, o corpo alquebrado e maltratado pela vida, mas tinha a alma lisa e pura. Com essa longa experiência, Cora sabia, ao conceber essa frase, que a primeira etapa da educação se dá em casa, e não importa a idade de quem assume a tarefa de educar. E é em casa que os filhos começam a absorver as virtudes e os vícios dos pais ou avós. Porque, mais do que as palavras, as atitudes calam alto na história das crianças.
Depois vem a escola. E nesse momento surgem numerosas dúvidas para que se consiga escolher a melhor escola. Alguns pais não se interessam tanto e relegam essa tarefa para terceiros. Outros até exageram, perguntando a todo tipo de especialista ou a qualquer outra pessoa, em que escola devem matricular os seus filhos.
Hoje, é comum a mídia oferecer, com base em alguma pesquisa ou avaliação, um ranking com as melhores e as piores escolas. Não acho que esse seja um critério interessante para se basear no momento da escolha, até porque esses critérios são muitas vezes duvidosos e nem sempre conseguem mostrar o que é uma escola de qualidade.
Há alguns aspectos, entretanto que podem ser observados e que ajudam na escolha:
1 - Os pais devem visitar a escola com os filhos e perceberem o seu ambiente. É fundamental que a criança goste da escola em que estuda.
2- O aspecto físico é importante. Salas de aula agradáveis, biblioteca, espaço de cultura, lazer, esporte. Não é necessário que o prédio seja luxuoso, mas que seja limpo e digno de um espaço em que se educa.
3 - É importante avaliar o quanto a escola investe na formação de seus professores, que são a alma da escola. Se o espaço físico for suntuoso, mas o corpo docente despreparado e desmotivado, é preferível procurar outra escola.
4 - Mesmo que os pais você não sejam especialistas em educação, é recomendável saber a linha pedagógica da escola, o seu projeto de ensino-aprendizagem e formas de avaliação.
5 - Deve-se analisar o currículo da escola, cuidadosamente, para verificar se há preocupação com temas do cotidiano como ética, cidadania, respeito ao meio ambiente, diversidade cultural, entre outros. Os pais não devem ter vergonha de perguntar tudo ao orientador que os receberem na escola. E, durante a conversa, é possível reparar no preparo dele, ao dar as respostas.
6 - Os pais devem observar os funcionários, e se possível, o diretor da escola. Uma regra básica é que todo o educador deve ser educado. Uma escola que preza por esse valor investe na capacitação de todas as pessoas que nela trabalham.
7 - Um aspecto essencial a ser observado é se a escola prepara para a cooperação ou apenas para a competição. Cuidado. Pode ser que os pais queiram apenas que o filho ingresse depois em uma faculdade, sendo aprovado no exame vestibular. Isso é importante, mas a escola tem que preparar para a vida toda, e não apenas para um exame.
8 - Uma alternativa interessante é questionar alguns pais que freqüentam a escola para ver se o discurso dos educadores é condizente com a prática.
9 - Os pais devem avaliar se o preço é compatível com o seu salário. A mesma avaliação deve ser feita em relação à localização, para que não vire um transtorno, o caminho de ir e vir.
10 - Os pais devem decidir junto com o seu filho, não importa qual seja a idade dele. É importante que ele sinta que ajudou a escolher a escola em que estuda.
Essas são algumas dicas. Há outras. O mais importante é que o pai, a mãe, o avô ou a avó, levem a sério a educação da criança. Em casa, na escola, na vida.
Outra dica: por melhor que seja uma escola, ela nunca vai suprir a carência de uma família ausente. Portanto, a família deve participar de verdade do processo educativo de seus filhos. Esta nem é uma dica minha. É de Cora Coralina, quando, na sua grande sabedoria, disse isto: Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.
Artigo publicado no jornal O Popular, Goiânia (28/10/2007)
quinta-feira, 22 de novembro de 2007
Mestres em falta
Os sindicatos de professores se contorcem diante da questão, talvez por não ter satisfação adequada para dar a alunos e pais diante do descalabro instalado: só na rede estadual paulista de ensino ausentam-se das salas de aula, a cada dia, 29,4 mil dos 230 mil mestres. Uma taxa de absenteísmo de 12,8%, contra menos de 1% em escolas privadas. O dado, noticiado domingo nesta Folha, documenta distorção disseminada por sistemas públicos de ensino do Brasil.
A Apeoesp (sindicato dos professores) oferece racionalização automática para o sumiço de seus representados: salários baixos, longas jornadas, salas superlotadas e violência na escola. Embora o argumento possa explicar em parte a atitude, jamais terá o poder de justificá-la.
A depreciação do magistério alcança patamares incompatíveis com a meta do governo federal de elevar o ensino básico, até 2022, ao nível de países da OCDE (clube das nações mais ricas). O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) contemplou isso ao propor um piso nacional de R$ 850 para professores. O projeto de lei correspondente (nº 619/2007) foi aprovado em duas comissões da Câmara dos Deputados (faltam outras duas); na de Educação e Cultura, o valor subiu para R$ 950.
Essa política horizontal de recuperação de salários é necessária, mas não resolve a questão. Ganhar um pouco mais não levará professores a tornar-se assíduos -a média dos proventos de mestres paulistas, por exemplo, é 53% superior ao valor proposto como piso para o país. Aumento salarial não garante melhora automática do ensino. É preciso exigir contrapartida dos professores. Reservar uma parte relevante do orçamento para premiar as escolas que mais reduzirem as faltas -e mais melhorarem o desempenho dos alunos- é um meio inteligente de perseguir esse objetivo.
A via do estímulo, porém, não basta. Não há como conciliar o interesse público com a pletora de 19 dispositivos que facultam ao professor paulista ausentar-se do trabalho sem desconto no salário. Tampouco cabe aguardar condições perfeitas de trabalho para que se aceite, enfim, reduzir a absurda média de 32 faltas anuais por docente.
Regras permissivas de aposentadoria também requerem revisão. Não é razoável que inativos consumam 1/3 da folha de pagamento do professorado paulista. Verbas de educação precisam ser canalizadas, com prioridade, para a melhoria do ensino.
Tal é o espírito do PDE federal. O MEC anunciou que investirá, ainda em 2007, R$ 1 bilhão em apoio técnico e financeiro a municípios que adotarem metas de desempenho (medido pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, Ideb). Uma legião de 3.487 municípios e 17 Estados já formalizou adesão; das 1.242 cidades prioritárias, com Ideb muito baixo, 985 aderiram.
Segundo o MEC, os primeiros desembolsos começam em dez dias. Seria útil que, entre os critérios de avaliação, figurassem também metas ambiciosas de redução do absenteísmo docente.
Folha de S. Paulo, 13/11/2007
segunda-feira, 19 de novembro de 2007
Recursos irrisórios para educação
O governo federal promete destinar R$ 41 bilhões, até 2010, em educação, ciência e tecnologia. Este investimento, esperado com ceticismo, faz parte integrante do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento). É a mesma expectativa que o governo criou com a promessa, que até agora não cumpriu, de dar para todos os alunos das escolas públicas um laptop (computador pequeno de colo) e também de vendê-lo no mercado a um preço acessível.
A universalização da informática nas escolas públicas, que todos aprovaram, é um projeto ambicioso, se considerarmos que nas áreas rurais existem milhares de escolas que não têm eletricidade. O uso deste equipamento eletrônico por milhões de crianças brasileiras é de um valor incomparável, capaz de elevar rapidamente o nível de aproveitamento do ensino.
Atualmente, a média nacional do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) estabelecido pelo governo é de 3,8 no primeiro ciclo e de 3,5 no segundo. No sertão, que vai do Norte de Minas até o interior do Nordeste, este índice cai para 2,7 nos dois ciclos.
O Brasil é, ainda, um país pobre. Com enormes disparidades regionais e grandes contingentes de pobreza e de miséria. Essas desigualdades econômicas refletem na qualidade do ensino e no grau de acesso das crianças às escolas.
As grandes diferenças de renda produzem ou acentuam as distâncias sociais, principalmente na educação que recebem os estudantes filhos de famílias abastadas e os filhos de famílias pobres. Os ricos cursam as melhores escolas, dedicam-se ao estudo em tempo integral e têm acesso aos livros e outros instrumentos de ensino. Os pobres, principalmente os jovens que estudam e freqüentam os cursos noturnos, sofrem todas as dificuldades, principalmente as de ordem material.
A experiência internacional ensina que sem investimento em educação não há possibilidade de um país se desenvolver. O professor Arnaldo Niskier, especialista emérito em educação, afirma que "a virada do Japão começou em 1868, quando o imperador Meiji assumiu o poder e passou a aplicar mais de 50% do orçamento em educação".
Os salários dos professores primários no Japão são superiores a US$ 3 mil; os professores do ensino médio ganham US$ 4.500 por mês. No Rio de Janeiro, o piso salarial é menos de US$ 250 e há 11 anos não se dá aumento aos professores. Os recursos que o governo anuncia que vai aplicar (R$ 41 bilhões) estão, ainda, muito aquém das nossas necessidades.
Nenhum país chegou ao "primeiro mundo" ou se destacou dos demais sem ter investido em larga escala na educação, na ciência e na tecnologia.
Na Inglaterra, a Universidade de Cambridge é, até hoje, a que mais produziu prêmios Nobel: 83 laureados. Nos Estados Unidos, a universidade de Harvard tem 20 mil alunos; a quarta maior biblioteca do planeta e foi considerada, pelo quarto ano consecutivo, pelo Academic Ranking of World Universities, a melhor universidade do mundo. Em 2007, já recebeu US$ 34,9 bilhões em doações e outros ativos financeiros. A Universidade de Stanford, uma das cinco mais importantes dos EUA, tem um estacionamento privativo para prêmios Nobel... Os americanos foram os que mais ganharam prêmios Nobel: 305.
A nós, resta a esperança de que, um dia, o governo compreenda a importância da educação e ajude o Brasil a encontrar o seu destino.
Jornal do Brasil, 13/11/2007
sábado, 17 de novembro de 2007
ESCUTATÓRIA
Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de
escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a
ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai
se matricular.
Escutar é complicado e sutil. Diz Alberto Caeiro que ''''não é bastante não
ser cego para ver as árvores e as flores. É preciso também não ter filosofia
nenhuma''''.
Filosofia é um monte de idéias, dentro da cabeça, sobre como são as coisas.
Para se ver, é preciso que a cabeça esteja vazia.
Parafraseio o Alberto Caeiro: ''''Não é bastante ter ouvidos para ouvir o
que é dito; é preciso também que haja silêncio dentro da alma''''. Daí a
dificuldade: a gente não agüenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um
palpite melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a
dizer.
Como se aquilo que ele diz não fosse digno de descansada consideração e
precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer, que é muito
melhor.
Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil de nossa
arrogância e vaidade: no fundo, somos os mais bonitos...
Tenho um velho amigo, Jovelino, que se mudou para os Estados Unidos
estimulado pela revolução de 64. Contou-me de sua experiência com os índios.
Reunidos os participantes, ninguém fala. Há um longo, longo silêncio. (Os
pianistas, antes de iniciar o concerto, diante do piano, ficam assentados em
silêncio, abrindo vazios de silêncio, expulsando todas as idéias
estranhas.). Todos em silêncio, à espera do pensamento essencial. Aí, de
repente, alguém fala. Curto. Todos ouvem.
Terminada a fala, novo silêncio. Falar logo em seguida seria um grande
desrespeito, pois o outro falou os seus pensamentos, pensamentos que ele
julgava essenciais. São-me estranhos. É preciso tempo para entender o que o
outro falou. Se eu falar logo a seguir, são duas as possibilidades.
Primeira: ''''Fiquei em silêncio só por delicadeza. Na verdade, não ouvi o
que você falou. Enquanto você falava, eu pensava nas coisas que iria falar
quando você terminasse sua (tola) fala. Falo como se você não tivesse
falado''''.
Segunda: ''''Ouvi o que você falou. Mas isso que você falou como novidade eu
já pensei há muito tempo. É coisa velha para mim. Tanto que nem preciso
pensar sobre o que você falou''''.
Em ambos os casos, estou chamando o outro de tolo. O que é pior que uma
bofetada. O longo silêncio quer dizer: ''''Estou ponderando cuidadosamente
tudo aquilo que você falou''''. E assim vai a reunião.
Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de
pensamentos. E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir
coisas que não ouvia.
Eu comecei a ouvir.
Fernando Pessoa conhecia a experiência, e se referia a algo que se ouve nos
interstícios das palavras, no lugar onde não há palavras.
A música acontece no silêncio. A alma é uma catedral submersa.
No fundo do mar - quem faz mergulho sabe - a boca fica fechada. Somos todos
olhos e ouvidos. Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da
filosofia, ouvimos a melodia que não havia, que de tão linda nos faz chorar.
Para mim, Deus é isto: a beleza que se ouve no silêncio. Daí a importância
de saber ouvir os outros: a beleza mora lá também.
Comunhão é quando a beleza do outro e a beleza da gente se juntam num
contraponto.
sexta-feira, 16 de novembro de 2007
quarta-feira, 7 de novembro de 2007
Educação: Conhecimento e Amor
A educação tem de formar o caráter. Escola não faz milagre. A família tem de fazer a sua parte.
Milhões de crianças e jovens em todo país começaram mais um ano letivo. Milhares de professores, diretores de escolas, funcionários têm o desafio de acolherem esses aprendizes. É um ritual que se refaz. Novas turmas. Novos sonhos ou ausência de sonhos – desafio maior! Despertar o potencial, o prazer do conhecimento. Como dizia Aristóteles, "A vida melhor e mais prazerosa é a vida do intelecto, uma vez que o intelecto é, em sentido mais amplo, o homem". Isso quer dizer que a educação deve proporcionar valores, deve levar à justiça, à serenidade, à capacidade de pensar antes de fazer.
Esse era o sonho de Aristóteles no Liceu e era também o de John Locke, filósofo inglês do século 17 que dizia "...de todos os homens com quem encontramos, nove em dez são o que são, bons ou maus, úteis ou não, pela sua educação".
A educação tem de formar o caráter. Na escola, os mestres recebem alunos que vêm de histórias de vida completamente diferentes. Há pais que participam ativamente da história de seus filhos. Há pais ausentes. Há pais amorosos; há outros, agressivos. E isso faz a diferença. Escola não faz milagre. A família tem de fazer a sua parte.
É o compromisso em desenvolver a autonomia da criança. Disse Rousseau, "A infância tem um jeito de enxergar, pensar e sentir peculiar. Nada é menos sensato do que substituir o dela pelo nosso". Cem anos mais tarde, confirmou Herbert Spencer, em meados do século 19, "as crianças deveriam ser levadas a fazer suas próprias investigações e assim tirar suas próprias conclusões". Respeitar a criança e todo seu potencial é papel do educador.
Quanto aos jovens, Dom Bosco assim os acolhia: "Basta que sejais jovens para que eu vos ame". A irreverência, a rebeldia, a inquietação podem ser aliados na educação da juventude. Não pode o professor enxergar os alunos com desconfiança. Não são um problema. São crianças e jovens que dependem da orientação dos mestres, grandes parceiros nessa caminhada.
Não há idade para aprender. O aprendizado é possível em qualquer idade. Dizia Kant, "Como então buscar a perfeição? Onde fica a nossa esperança? Na educação e em nada mais". Pois a educação melhora nossa conduta e amplia nossos horizontes.
Que nossas crianças, jovens e adultos encham-se de esperança no seu primeiro dia de aula. Que os professores reinventem a forma de ensinar a cada momento. Precisamos mais de educadores e menos de burocratas. Que também os pais estejam presentes, sempre. E que todos participemos da construção de uma sociedade melhor.
Jovem empreendedor
Futuro que é obra de fôlego assinada, sem sombra de dúvida, pela potencialidade da juventude.
A juventude traz consigo uma rebeldia natural. Uma força de espírito que se caracteriza pelo inconformismo e pela contestação das tradições que não condizem com as exigências dos novos tempos. Muitas vezes, o coro da platéia social acusa o jovem de inconstante e alienado, e até de irresponsável. Talvez por esse motivo, convencionou-se dizer que “jovem é um problema”. Mas trata-se de afirmação já rebatida pela História, edificada também por numerosos heróis e heroínas que registraram feitos em tenra idade.
Protagonistas que colaboraram para fazer do mundo lugar mais propício ao idealismo ao empreendimento de processos capazes de quebrar paradigmas, mudar rotas equivocadas, converter expectativas pessimistas em realizações bem-sucedidas.
Jovem não constitui problema e, sim, solução! Basta instigá-lo a produzir, dando espaço para que seus sonhos tenham vez na atmosfera geralmente restrita e repressiva que paira sobre corações e mentes dos que perderam os positivos ímpetos juvenis.
São fartos os exemplos de jovens que mudaram a História antes mesmo de completarem 20 anos. É o caso de Joana D’Arc e de Alexandre da Macedônia. Ela estimulava com belíssimos discursos os seus patrícios à realização dos sonhos. Ele foi estrategista e líder indispensável à conquista de boa parte da Europa e do Oriente antigos.
Em outros tempos e frentes, jovens brasileiros subiram aos palcos da vida para mostrar novos conceitos artísticos e a força criativa da cultura verde-amarela. Foi assim na Semana de 22, evento divisor de águas no cenário nacional graças à atuação inovadora do grupo composto de jovens como Sérgio Milliet, Guiomar Novaes, Heitor Villa-Lobos, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Menotti del Picchia, Anita Malfatti, entre outros. Impacto semelhante também pôde ser sentido na década de 60 com precoces arrebatadores como Chico Buarque de Holanda, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Maria Bethânia e Gal Costa. Libertários que cantavam e compunham as trilhas sonoras da renovação. Eram os representantes da rebeldia do bem.
E há aquele jovem em especial, cujo carisma, inteligência e altruísmo lançaram luzes sobre uma nova forma de ver e de vivenciar o amor entre as pessoas. Morto aos 33 anos, Jesus Cristo nos ensinou, sobretudo, a importância da solidariedade, da fraternidade e da justiça.
Jovens são empreendedores. Mulheres e homens que ousam e que deixam marcas. As marcas do verdadeiro talento que nem sempre exige longos períodos para ser manifestado. Caso contrário, não teríamos Clarice Lispector escrevendo Perto do coração selvagem, aos 17 anos. Ou Rachel de Queiroz redigindo O quinze, sob a precária luz das lamparinas, aos 19. Em todos os campos do conhecimento, a criatividade do jovem é indispensável para que o novo aconteça.Nesse sentido, empresas e organizações que não dão espaço ao olhar fremente dos jovens felinos que saem pela primeira vez da caverna - como poetizava Mário Quintana - erram duas vezes. Primeiro, porque demonstram falta de generosidade, e não estão abertas para ensinar novos navegadores a conduzir a nau. Segundo, porque correm o risco de envelhecer, embotadas em padrões que se esgotam por escassez de ousadia, da paixão, e do olhar de entusiasmo dos errantes marinheiros de primeira viagem.
É preciso fazer a apologia do erro. Da contribuição fantástica, mágica de todos os erros - como dizia Oswald de Andrade. Quem não erra não aprende. Não faz. Entre a omissão dos que enterram os talentos e a audácia bem-vinda dos que se lançam a multiplicá-los, fiquemos com o legado dos audaciosos. Esses, sim, são empreendedores que dão início ao esboço de um futuro de traços dinâmicos e belos.
Que o Brasil, jovem país, dê espaço a esses gigantes em potencial. E que eles possam perceber sua importância e sua responsabilidade. Até porque o futuro começa a ser desenhado agora. Futuro que é obra de fôlego assinada, sem sombra de dúvida, pela potencialidade da juventude.
Gentileza, ato de amor
Pense em como o mundo pode ficar melhor, se as pessoas praticarem mais a gentileza. E, neste fim de ano, experimente a sensação maravilhosa de renascer, como fez o Cristo entre os homens. Seja gentil.
A origem da palavra gentileza, segundo o dicionário Houaiss, é latina. Vem do radical gens (gentis, no genitivo), que significava o grupamento familial composto de indivíduos livres de nascimento, com um antepassado comum. Não vamos nos estender nessa definição, porque uma frase já bastou para entendermos a importância da palavra: “indivíduos livres de nascimento”!
Pensem na beleza desta idéia. A pessoa nascida livre não tem maus hábitos, não tem preconceitos, não tem barreiras, não se entrega a pressões sociais. Ela é livre, e isto é o que mais importa no caráter de alguém.
Ser livre não significa estar isolado. Ao contrário, viver em grupo demanda uma docilidade de alma que os mais velhos chamavam de boa-vontade. No fundo, demanda que as pessoas manifestem ações na direção da felicidade do outro, como amizade, solidariedade, acolhimento, companheirismo. São ações que eu prefiro chamar de gentileza. Uma qualidade do espírito refinado pela educação, e especialmente pelo exemplo. Uma qualidade baseada no mais primário de todos os valores: o respeito. Saber ouvir, saber dividir, saber reconhecer que há pluralidade do mundo e que todos podem viver em harmonia. Ser gentil é saber sonhar. Em resumo, uma forma de amar.
A gentileza está na raiz do inglês gentleman (cavalheiro, homem gentil), e na evolução da noção latina da palavra gentilis (aquele que pertence a uma família). Ser gentil, portanto, surge de um movimento interno, essa liberdade atávica e essa predisposição para o bem, e de uma influência externa, em geral oferecida pela família. Ser gentil depende do conhecimento, por meio da educação que causa uma constante transformação interior. Uma transformação mais fácil ainda quando a pessoa já nasce livre.
Foi pensando na importância da delicadeza nos relacionamentos, e em como essa postura estimula o bem-viver e a felicidade entre as pessoas, que acabo de escrever dois livros. Um deles é um romance O sol depois da chuva que explora as possibilidades de transformação de pessoas e de suas histórias por meio de gestos gentis. O segundo Gentileza é um livro de bolso, em que discorro, em pensamentos breves e concisos, sobre atitudes de gentileza, no dia-a-dia, nas coisas que imaginamos não ter grande importância, mas que fazem toda a diferença.
Pense em como o mundo pode ficar melhor, se as pessoas praticarem mais a gentileza. E, neste fim de ano, experimente a sensação maravilhosa de renascer, como fez o Cristo entre os homens. Seja gentil. E tenha um feliz Natal. Gabriel Chalita é membro da Academia Paulista de Letras. Já publicou diversos livros, entre eles O Sol Depois da Chuva, Gentileza, Pedagogia do Amor, Educação – A solução está no afeto, Seis Lições de Solidariedade e Histórias de Professores que Ninguém Contou. Atualmente preside o Instituto Educativa (www.educativapalestras.com.br)