Em agosto de 1994, morava sozinha em São Paulo, trabalhava com publicidade, onde comercializava espaço único de painel de definição que havia em São Paulo e também fazia projetos para implantação de novos painéis cuidando de toda parte comercial e tecnológica. Estava num momento de bastante ascensão profissional.
Fui então passar um fim de semana na praia com o Paulo, que era meu namorado, e o Henrique que era e continua sendo meu maior amigo, em todos os sentidos. Saímos um pouco sem rumo, no dia 20 de agosto e fomos até Parati onde passamos a noite. No dia anterior houve a festa da pinga e no seguinte passamos o dia na praia de Trindade, que é super agradável.
Estava muito triste, haviam muitas coisas na minha vida que estavam me deixando bastante confusa, principalmente o meu relacionamento com o Paulo. Na manhã desse dia 21 eu acordei antes dos dois na pousada e lembro que pedi muito forte para Deus, olhando para sol, que eu queria mudar o rumo da minha vida por que as coisas não andavam muito agradáveis.
Saímos de Paraty umas 8 horas da noite em direção à serra de Taubaté e quando estávamos subindo a serra, ele estava correndo um pouquinho a mais do que deveria naquela estrada e fiquei até com um pouco de medo. Então o Paulo, que estava dirigindo, perdeu o controle do carro e ele caiu a uns 15 metros, capotando numa curva nessa serra que chama "curva da morte".
Os dois conseguiram sair do carro. O Paulo não tinha nenhum ferimento e o Henrique tinha machucado o joelho e eu não consegui sair, fiquei presa e no momento não dava para saber se eu estava paralisada mas senti uma impossibilidade de sair pois o espaço era pequeno. Eu me lembro que ainda levantava um pouco os braços e só conseguir erguer do cotovelo para cima, a parte debaixo não conseguia e eu até achei que tinha quebrado os braços, não me dei conta do que estava rolando.
Fiquei duas horas e meia, ali num pântano deitada e sentia o efeito do reflexo da lua na água e que tudo era úmido ali. O Paulo ficou segurando a minha cabeça e cada vez que respirava eu gritava de dor. Eu nunca tinha sentido uma dor tão grande quanto essa dor que eu senti no pescoço e eu não deixei ninguém me tocar. Só relaxei na hora que chegou um cara de roupa laranja dizendo que era do corpo de bombeiros e que iriam serrar o carro procurando me deixar totalmente imobilizada. Nessa hora eu apaguei, eu desmaiei do tipo "eu não precisava mais tomar conta de mim" e então me lembro de uns flashes de eu indo para o Hospital de Taubaté de São Luiz do Paraitinga na verdade. Isso foi num domingo à noite, dia 21 de agosto e no dia seguinte ao meio dia fui transferida para o Hospital Israelita Albert Einstein de helicóptero.
Eu quebrei a quarta e a quinta vértebras cervicais e tive também uma lesão medular na altura da terceira vértebra. Fiquei 22 dias na UTI, respirando por aparelhos sem saber se eu conseguiria sair ou não, pois demorou um tempo para que meu diafragma começar a reagir, começar a tomar conta da situação. Depois de três dias do acidente eu fiquei numa tração, onde você fica deitado na horizontal com pesos na cabeça para o pescoço voltar ao lugar, mas no meu pescoço havia muitos fragmentos de ossos que estavam machucando. Com a lesão na medula então era extremamente necessária a cirurgia e então fizeram uma artrodese para tirar um pouco de osso da bacia e esculpir uma nova vértebra. Tudo isso foi feito em três dias depois do acidente, no dia 24 de agosto e desde então eu nunca parei de melhorar. Eu tive muita sorte por que há muito pouco tempo havia sido lançado um medicamento, um corticóide chamado Metilpredinissolone que evitava uma segunda leva de morte neurológica, que seria como se fosse um suicídio coletivo de neurônios e que acaba levando a uma situação chamada de "apoptose" que na verdade seria uma complicação então pois com o choque mecânico inicial da pancada que já mata ovários, várias células nervosas e depois uma cadeia de morte que vem acontecendo causando uma transformação que ocorreu no tecido nervoso. Esse corticóide inibe a continuação dessa morte neurológica e o que faz uma grande diferença em um ou dois níveis de lesão.
Eu tive muita sorte de ter um neurocirurgião de plantão no hospital que conhecia esse Metilpredinissolone e que provavelmente fez muita diferença na minha vida. Pode ser que se não tivesse sido ministrado esse corticóide nas primeiras oito horas, eu tivesse hoje que respirar com a ajuda de aparelhos o que faz muita diferença pois você não precisa estar conectado a uma parede e têm a liberdade de ir e vir sem se preocupar com a respiração.
Foram 22 dias de UTI e no total foram dois meses no Einstein. Quando eu consegui ter uma respiração totalmente auto-suficiente, me colocaram no avião direto do hospital para o aeroporto em direção a um centro de reabilitação em Boston, ficando lá uma semana. Era muito ruim ser tratada como uma pessoa que não tem mais jeito, que não precisa de tanta higiene e assim no primeiro momento eu quase entrei em depressão. Meu irmão então foi conhecer um outro centro e fizeram a minha transferência para o Centro de Reabilitação Hamervill Reabiliton Centre, em Pittisburg, esse realmente foi muito bom para mim. Fiquei mais uns dois meses lá e minha mãe e meu irmão ficaram junto comigo. Meu pai também foi para lá para me ver.
No total foram quatro meses de internação e então voltei chegando em São Paulo no dia 24 de dezembro. Eu me lembro que foram os dias mais difíceis de minha vida pois eu não voltei para minha casa, voltei para casa de uma amiga que cedeu a casa por que na minha casa ia ser muito difícil a locomoção com cadeira de rodas, e no meu apartamento que era duplex, eu não tinha como subir e descer as escadas. Meus pais estavam reformando uma casa que não estava pronta e então nesse ínterim nós ficamos na casa dessa amiga.
Cheguei há uma situação que era totalmente nova para mim, um outro corpo, um corpo que estava paralisado do pescoço para baixo e dependia 100% da ajuda de alguém para qualquer atividade, numa casa que eu não conhecia, voltando a morar com meus pais que eu já não estava mais acostumada e assim como se estivesse mudado de planeta. Essa falta de referenciais foi muito dura, foi muito complicado na noite de Natal que sensibiliza mais ainda, esse dia foi um dos dias mais difíceis da minha vida. Fui então me acostumando, graças a Deus, pois eu sempre tive um time muito rápido para uma adaptação nas novas situações.
A partir daí eu fiz muita fisioterapia numa clínica americana e continuo aqui nesse ritmo. A cada dia fui evoluindo e foi muito importante para mim, contar num primeiro momento com a ajuda de meu irmão, minha mãe e o meu pai. Aos poucos eu fui assumindo o meu próprio tratamento e a minha vida por que eu fui colocando muita criatividade em cima do meu dia-a-dia, então o tratamento com a minha fisioterapia foi ficando cada vez mais gostoso pois foi ficando com a minha cara, com meu jeito e meu corpo foi acompanhando.
No início fiquei muito magra, muito ossudinha, muito pouco tono muscular, percebi então que eu ia ter muito trabalho para readquirir um corpo mais tonificado, mais saudável e menos frágil, mas em nenhum momento eu duvidei que isto pudesse acontecer e venho trabalhando e continuo trabalhando muito para melhorar e ganhar mais possibilidades com o meu corpo. Quanto mais possibilidades eu ganho, mais ele me oferece e agradece por ter feito um bom trabalho, com muito tesão, o corpo percebe a diferença.
Fui então passar um fim de semana na praia com o Paulo, que era meu namorado, e o Henrique que era e continua sendo meu maior amigo, em todos os sentidos. Saímos um pouco sem rumo, no dia 20 de agosto e fomos até Parati onde passamos a noite. No dia anterior houve a festa da pinga e no seguinte passamos o dia na praia de Trindade, que é super agradável.
Estava muito triste, haviam muitas coisas na minha vida que estavam me deixando bastante confusa, principalmente o meu relacionamento com o Paulo. Na manhã desse dia 21 eu acordei antes dos dois na pousada e lembro que pedi muito forte para Deus, olhando para sol, que eu queria mudar o rumo da minha vida por que as coisas não andavam muito agradáveis.
Saímos de Paraty umas 8 horas da noite em direção à serra de Taubaté e quando estávamos subindo a serra, ele estava correndo um pouquinho a mais do que deveria naquela estrada e fiquei até com um pouco de medo. Então o Paulo, que estava dirigindo, perdeu o controle do carro e ele caiu a uns 15 metros, capotando numa curva nessa serra que chama "curva da morte".
Os dois conseguiram sair do carro. O Paulo não tinha nenhum ferimento e o Henrique tinha machucado o joelho e eu não consegui sair, fiquei presa e no momento não dava para saber se eu estava paralisada mas senti uma impossibilidade de sair pois o espaço era pequeno. Eu me lembro que ainda levantava um pouco os braços e só conseguir erguer do cotovelo para cima, a parte debaixo não conseguia e eu até achei que tinha quebrado os braços, não me dei conta do que estava rolando.
Fiquei duas horas e meia, ali num pântano deitada e sentia o efeito do reflexo da lua na água e que tudo era úmido ali. O Paulo ficou segurando a minha cabeça e cada vez que respirava eu gritava de dor. Eu nunca tinha sentido uma dor tão grande quanto essa dor que eu senti no pescoço e eu não deixei ninguém me tocar. Só relaxei na hora que chegou um cara de roupa laranja dizendo que era do corpo de bombeiros e que iriam serrar o carro procurando me deixar totalmente imobilizada. Nessa hora eu apaguei, eu desmaiei do tipo "eu não precisava mais tomar conta de mim" e então me lembro de uns flashes de eu indo para o Hospital de Taubaté de São Luiz do Paraitinga na verdade. Isso foi num domingo à noite, dia 21 de agosto e no dia seguinte ao meio dia fui transferida para o Hospital Israelita Albert Einstein de helicóptero.
Eu quebrei a quarta e a quinta vértebras cervicais e tive também uma lesão medular na altura da terceira vértebra. Fiquei 22 dias na UTI, respirando por aparelhos sem saber se eu conseguiria sair ou não, pois demorou um tempo para que meu diafragma começar a reagir, começar a tomar conta da situação. Depois de três dias do acidente eu fiquei numa tração, onde você fica deitado na horizontal com pesos na cabeça para o pescoço voltar ao lugar, mas no meu pescoço havia muitos fragmentos de ossos que estavam machucando. Com a lesão na medula então era extremamente necessária a cirurgia e então fizeram uma artrodese para tirar um pouco de osso da bacia e esculpir uma nova vértebra. Tudo isso foi feito em três dias depois do acidente, no dia 24 de agosto e desde então eu nunca parei de melhorar. Eu tive muita sorte por que há muito pouco tempo havia sido lançado um medicamento, um corticóide chamado Metilpredinissolone que evitava uma segunda leva de morte neurológica, que seria como se fosse um suicídio coletivo de neurônios e que acaba levando a uma situação chamada de "apoptose" que na verdade seria uma complicação então pois com o choque mecânico inicial da pancada que já mata ovários, várias células nervosas e depois uma cadeia de morte que vem acontecendo causando uma transformação que ocorreu no tecido nervoso. Esse corticóide inibe a continuação dessa morte neurológica e o que faz uma grande diferença em um ou dois níveis de lesão.
Eu tive muita sorte de ter um neurocirurgião de plantão no hospital que conhecia esse Metilpredinissolone e que provavelmente fez muita diferença na minha vida. Pode ser que se não tivesse sido ministrado esse corticóide nas primeiras oito horas, eu tivesse hoje que respirar com a ajuda de aparelhos o que faz muita diferença pois você não precisa estar conectado a uma parede e têm a liberdade de ir e vir sem se preocupar com a respiração.
Foram 22 dias de UTI e no total foram dois meses no Einstein. Quando eu consegui ter uma respiração totalmente auto-suficiente, me colocaram no avião direto do hospital para o aeroporto em direção a um centro de reabilitação em Boston, ficando lá uma semana. Era muito ruim ser tratada como uma pessoa que não tem mais jeito, que não precisa de tanta higiene e assim no primeiro momento eu quase entrei em depressão. Meu irmão então foi conhecer um outro centro e fizeram a minha transferência para o Centro de Reabilitação Hamervill Reabiliton Centre, em Pittisburg, esse realmente foi muito bom para mim. Fiquei mais uns dois meses lá e minha mãe e meu irmão ficaram junto comigo. Meu pai também foi para lá para me ver.
No total foram quatro meses de internação e então voltei chegando em São Paulo no dia 24 de dezembro. Eu me lembro que foram os dias mais difíceis de minha vida pois eu não voltei para minha casa, voltei para casa de uma amiga que cedeu a casa por que na minha casa ia ser muito difícil a locomoção com cadeira de rodas, e no meu apartamento que era duplex, eu não tinha como subir e descer as escadas. Meus pais estavam reformando uma casa que não estava pronta e então nesse ínterim nós ficamos na casa dessa amiga.
Cheguei há uma situação que era totalmente nova para mim, um outro corpo, um corpo que estava paralisado do pescoço para baixo e dependia 100% da ajuda de alguém para qualquer atividade, numa casa que eu não conhecia, voltando a morar com meus pais que eu já não estava mais acostumada e assim como se estivesse mudado de planeta. Essa falta de referenciais foi muito dura, foi muito complicado na noite de Natal que sensibiliza mais ainda, esse dia foi um dos dias mais difíceis da minha vida. Fui então me acostumando, graças a Deus, pois eu sempre tive um time muito rápido para uma adaptação nas novas situações.
A partir daí eu fiz muita fisioterapia numa clínica americana e continuo aqui nesse ritmo. A cada dia fui evoluindo e foi muito importante para mim, contar num primeiro momento com a ajuda de meu irmão, minha mãe e o meu pai. Aos poucos eu fui assumindo o meu próprio tratamento e a minha vida por que eu fui colocando muita criatividade em cima do meu dia-a-dia, então o tratamento com a minha fisioterapia foi ficando cada vez mais gostoso pois foi ficando com a minha cara, com meu jeito e meu corpo foi acompanhando.
No início fiquei muito magra, muito ossudinha, muito pouco tono muscular, percebi então que eu ia ter muito trabalho para readquirir um corpo mais tonificado, mais saudável e menos frágil, mas em nenhum momento eu duvidei que isto pudesse acontecer e venho trabalhando e continuo trabalhando muito para melhorar e ganhar mais possibilidades com o meu corpo. Quanto mais possibilidades eu ganho, mais ele me oferece e agradece por ter feito um bom trabalho, com muito tesão, o corpo percebe a diferença.
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