"Os Educadores-sonhadores jamais desistem de suas sementes,mesmo que não germinem no tempo certo...Mesmo que pareçam frágeisl frente às intempéries...Mesmo que não sejam viçosas e que não exalem o perfume que se espera delas.O espírito de um meste nunca se deixa abater pelas dificuldades. Ao contrário, esses educadores entendem experiências difíceis com desafios a serem vencidos. Aos velhos e jovens professores,aos mestres de todos os tempos que foram agraciados pelos céus por essa missão tão digna e feliz.Ser professor é um privilégio. Ser professor é semear em terreno sempre fértil e se encantar com acolheita. Ser professor é ser condutor de almas e de sonhos, é lapidar diamantes"(Gabriel Chalita)

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sexta-feira, 8 de junho de 2007

O MENINO QUE QUERIA VER O SOL



Era uma vez um menino ...comum, como outro qualquer de sua idade, uns 7 anos, talvez.

Carregava sonhos, aspirações, mas vivia trancafiado em um pequeno mundo.Filho único.

Os pais viajavam muito e deixavam-no com uma ajudante, dona Marta, que assim o criara como se fora seu próprio filho.

Era uma mulher frágil.

Vivia doente e não lhe ajudavam muito a saúde e o trabalho que davam os dois filhos adolescentes. Viúva desde muito, com dificuldade enorme criava os filhos. Não era muito carinhosa com eles, porque as agruras da vida a deixaram sem paciência, endurecida.

O menino, por sua vez, não tinha muita intimidade com os pais.

Executivo ocupado, o pai considerava cumprir com o dinheiro tudo o que fosse necessário para a boa educação do filho.

Pagava boa escola, garantia boa comida, ofertava bons presentes nas datas adequadas, como aniversário e Natal.

A mãe, que acompanhava o marido no trabalho e nas viagens, pouco tempo dedicava ao filho.

Na escola, Alexandre era muito tímido, introspectivo.

Geralmente ficava sozinho desenhando, observando, pensando.

Em que pensa um menino de 7 anos?

Que sonhos pode ter?

Os desenhos eram quase sempre os mesmos, em torno do tema de Pégaso, o mitológico cavalo alado de que certa vez lhe contaram.

Ele guardara a imagem do lindo cavalo branco encantado que voava.

E que símbolo poderia ser mais belo?

Um animal forte e grande e que voa como pássaro pequeno e delicado.

Dona Marta era a única a quem era permitido ver os desenhos.

Alexandre tinha vergonha de mostrar a outras pessoas, e do pai tinha medo, desde uma vez em que tentou mostrar-lhe um desenho e obteve como resposta que fosse procurar a dona Marta, porque ele não tinha tempo para bobagens.

A mãe assistia à cena e concordou resmungando sobre dona Marta deixar o menino sozinho.

Isso mesmo: ele estava absolutamente sozinho, com o pai e a mãe.Alexandre olhava os seus desenhos, imaginava os cavalos voando, e sonhava voar também, até bem perto do sol.

– Como deve ser lindo o sol de perto...

Solidão de criança é coisa triste demais.

Olhar circunspecto de um pequerrucho de louros cabelos cacheados, olhar fundo de quem não tem ninguém.

E, se havia piscina na casa, sala de música, quarto com brinquedos, não havia o essencial.

Um dia ...tem sempre um dia.

Eis que antes da aurora, surge um cavalo no quintal.

Alexandre ouviu os relinchos, abriu correndo a janela, esfregou os olhos demoradamente e olhou de novo.

Ali estava mesmo o cavalo, altaneiro, imponente, e mais: com asas enormes.

E que falava:

- Você é o Alexandre, o menino que sonha voar?

O cavalo era lindo.

Olhos azuis. Asas brancas.E sorria.Um sorriso encantador.

Alexandre quase se esquece de responder, olhando embevecido para ele.

- Cavalo não fala

– tascou.

- Eu sou um cavalo especial.

Falo, vôo, canto, brinco e realizo sonhos.

Ora, você me desenhou tantas vezes e não me conhece ainda?

- Nos meus desenhos você fazia tudo isso mesmo, mas eram só desenhos...

- balbuciou.

O cavalo nada mais disse. Sorriu outra vez e num piscar de olhos se foi, voando céu afora.

Alexandre sentia frêmitos de felicidade.

Amanheceu.Dona Marta entrou no quarto para acordar o menino, mas ele já estava em pé, com os olhos azuis arregalados de alegria.

Dona Marta cismou com tamanha disposição que Alexandre mostrou para ir à escola.

Mal sabia ela o turbilhão que andava por dentro daquela cabecinha de caracóis dourados.

Passou as aulas inteiras pensando na lindeza, na alvura, no encantamento do cavalo.

Foi sonho... voltou para casa e para o almoço que engoliu depressa, depressa, para ir logo para o quarto rever os seus desenhos.

Não foi sonho... o cavalo voltaria.

O cavalo tinha que voltar.E voltou. Antes de amanhecer lá estava, chamando o menino. Alexandre pulou da cama e correu para a janela.

Dessa vez mais confiante, sorridente.

O cavalo de asas, afável como da primeira vez, perguntou:

- E então, meu amigo, você quer voar?- É o que mais quero! Voar alto, bem alto mesmo, até perto do sol.

O cavalo sorriu o mesmo sorriso maroto e balançou a cabeça, concordando:

- Amanhã, antes da aurora, viajaremos por muitos rincões, por lugares altos e distantes como as lindas estrelas, e viajaremos também por lugares baixos e bem próximos como a sua cidade e a sua escola.

E lá se foi o cavalo. Alexandre ficou estático por um momento, e em seguida se pôs a pular, a gritar, a cantar... era outro.

E só ele conhecia este segredo.

Viajaria o mundo inteiro, chegaria até as estrelas.

( Será que poderia alcançar o sol?)

Dona Marta pegou o menino cantarolando. Olhou, entre assustada e feliz. Amava Alexandre e tinha muita pena dele, pela falta de carinho e de atenção de seus pais. Fitava aqueles olhos azuis e pensava consigo mesma que o menino Jesus devia andar velando por ele.

Tão tímido, tão fraquinho... e agora fica por aí, rindo à toa.

O dia demorou como um suplício a passar. A escola, as tarefas, os desenhos, o quarto, tudo não tinha mais graça. Lá se foi a antiga solidão, trocada pela espera do amigo. Enfim anoiteceu. Enfim dormiu. Despertou antes de raiar o sol, com um frio percorrendo a barriga. Ele virá...Ele veio.

Veio de novo. Alexandre não se conteve.

Pulou pela janela e caiu-lhe sobre o dorso. Percebeu quão macio era o pêlo, que agradável o cheiro que trazia. Mas nada lhe chamou mais atenção do que aqueles olhos imensos, azuis de céu, que o olhavam com uma ternura que em ninguém antes reconhecera.

- Vamos, meu amigo? Pronto para voar?- Estou. É o que mais quero.

Voar e esquecer as coisas de que não gosto.- Que coisas são essas?O olhar de Alexandre ficou distante como se todas as imagens tristes tivessem voltado. As brigas dos pais, a falta de atenção, as conversas que ouvia em que resmungavam porque eram obrigados a viajar menos depois que tiveram o filho.

Sacudiu a cabeça.

- Nada. Não é nada.

– disse Alexandre

– Agora eu tenho um grande amigo, e o mais importante dos amigos.

- Então vamos voar. A emoção de voar é indescritível. Agarrado ao lombo do cavalo, Alexandre olhava fascinado o horizonte e avistava aos poucos sua casa, sua rua, sua cidade.

Tudo ia ficando menor, e menor, como cada vez menores pareciam ficar os problemas.

O horizonte parecia não ter fim. Estava amanhecendo e Alexandre, encantado com o sol, pediu ao amigo:

- Podemos voar até o sol?

- Podemos.

Podemos ir até onde você quiser.

- Quero chegar perto do sol.

- Se você chegar perto do sol, tudo que você vir começará a ser diferente.

Nenhuma paisagem será mais a mesma. Quem chega perto do sol, muda para sempre.Lá se foram. Alexandre e o cavalo voador. E o pégaso tinha razão: a visão do sol é esplendorosa. Alexandre ficou extasiado, fascinado. Apertava mais o cavalo, como a querer abraçá-lo. Agradecia o presente que estava recebendo. Ele era um menino que conseguiu voar até o sol.- É hora de partir – sugeriu o cavalo.

- Vamos, meu grande amigo. A partir de agora minha vida nunca mais será a mesma. E a volta foi ainda mais linda, se é que era possível tanta beleza.

Alexandre contemplava cada coisa. Encantava-se com as nuvens, com o verde que vislumbrava desde longe das florestas, com os rios enormes, os mares. Que lindo era o mundo!Quando chegou à sua cidade, o cavalo diminuiu a velocidade e voou lentamente sobre o casario.

Alexandre passou a ver as pessoas nas casas. Viu gente se amando e gente brigando. Viu animais pequenos que conseguiam vê-lo também. Viu bebês que sorriam quando ele passava, voando em seu cavalo.

Os adultos, esses não o viam, como se a sensibilidade embotada deles os impedisse de vê-lo.Perguntou ao cavalo:

- Por que os adultos não nos vêem?

- Eles vêem pouca coisa, meu querido Alexandre. Não acreditam em quase nada. Isso é triste. Olha a face alegre e singela do bebê ...com o tempo isso se perde.

- E não se recupera jamais?

Todo adulto tem que ser triste?

- Não, mas é preciso, para ser alegre, lembrar a própria essência, depois de ter viajado para bem perto do sol.

Alexandre entendeu tudo, como se fosse um sábio.

Porque ele havia chegado perto do sol e agora seria feliz para sempre.Perto da casa, viu os filhos de dona Marta.

Olhou-os com muita ternura e resolveu, ali mesmo, que ficaria amigo de ambos. Sabia quanto davam trabalho e pensou que, se pudessem ver o sol, mudariam.

Sem pestanejar, pediu ao cavalo:

- Meu amigo, quero levar aqueles dois para que vejam o sol também e possam ser felizes.

- Agora isso não será preciso.

Eles verão o sol pelos seus olhos. Eu sou um cavalo encantado, mas você é mais do que eu. Você é um menino encantado e será um homem iluminado se nunca se esquecer do sol.No jardim da casa, Alexandre agradeceu ao cavalo, que se despediu e avisou que não mais voltaria.

- Há outros alexandres em outros rincões que também devem voar e ver o sol.

Alexandre, chorando, entendeu a missão do amigo e também a sua própria missão.

***Dona Marta entrou no quarto e olhou perturbada para o menino.

Estava corado demais.

- Você anda tomando sol?

- Tomando sol?!

Eu vi o sol, dona Marta, eu vi o sol!

“Ah! Meu Deus! Isso só pode ser coisa do menino Jesus, que veio trazer alegria para essa criança.”

***- Estou atrasado?

- Não, hoje é domingo.

Não tem aula. E é Domingo de Páscoa. Sua mãe deixou esse ovo para você.

Ela teve de viajar com seu pai.Alexandre nem ficou triste.

- Venha, dona Marta, quero fazer uma coisa.

- Calma, moleque, que alegria é essa?

Saíram da casa em direção a algum lugar.

Dona Marta seguia, assustada. Chegaram à casa de dona Marta.

Os dois filhos ainda dormiam.

- O que você quer aqui, menino?

- Quero ver seus filhos.Ao ouvi-los, os dois meninos se levantaram.

Afinal era o filho do patrão, e pensaram que era algum serviço que teriam de fazer.

- Este ovo de Páscoa é para vocês.

Deu um beijo e um abraço em cada um e continuou:

- Foi um cavalo que voa que mandou que eu entregasse.

Os dois marmanjos se abraçaram e choraram muito.

Dona Marta chorava mais ainda, e fitando os olhos azuis de Alexandre, iluminados, pensou:

“Isso é coisa do menino Jesus.”


Gabriel Chalita

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