Acerca de sua pesquisa sobre "A cabeça do brasileiro", o sociólogo Alberto Carlos de Almeida declarou à revista "Veja" que a maioria dos brasileiros tem uma visão mais arcaica da sociedade porque tem baixa escolaridade e, por conseguinte, na medida em que a educação se universalize, a visão mais moderna se tornará majoritária. Daí podemos concluir que, enquanto não assumirmos a missão histórica de uma verdadeira elite, que entenda e assimile a importância estratégica da educação para superarmos nossas mazelas, e decida participar efetivamente da vida pública para garantir esta conquista, o Brasil não terá jeito!
Permanecemos no círculo vicioso de não termos uma educação de qualidade porque não temos uma elite participando da vida política. E não temos uma elite participando da vida política do país porque não temos educação política suficiente para discernir entre opinião pública e interesse público, até mesmo pela dissuasão cotidiana da mídia de que a política é o domínio da delinqüência social e não propriamente lugar dos homens de bem.
Quando, na ordem democrática, "sujar" as mãos com a política é o único jeito de se impedir a má aplicação do dinheiro público, sobretudo no campo sagrado da educação pública de qualidade, universal e laica. Se a participação política é dever de cada cidadão brasileiro e a essência da verdadeira cidadania, a má aplicação dos recursos públicos em qualquer campo da ação do Estado não é tão nefasta quanto na educação básica.
Se estamos nos dando conta de que não pode haver corrupção na aplicação dos recursos públicos, no caso da educação especificamente, temos de ser intolerantes! O que é mais uma tarefa da mídia do que propriamente da educação. Pois não precisamos ser necessariamente uma elite bem formada para nos convencermos da prioridade estratégica da educação. A educação não é apenas um sistema de transmissão de conhecimento, assim como a justiça não produz apenas conduta, a política, normas, e a mídia, informação. Para além disso, todos produzem valores! Principalmente os valores clássicos do legado humanista: a vida, a legalidade, a liberdade e a propriedade. Todos estes sistemas são responsáveis pela formação cívica e política do cidadão e, quando um falha ou se mostra insuficiente na reprodução dos valores da cultura de cidadania, temos de exigir maior desempenho dos demais.
Por isso a educação não pode ser projetada na mídia apenas como dever formal do Estado ou como pretexto para campanhas de marketing de reputação corporativa ou de responsabilidade social empresarial. Políticas públicas de educação de qualidade são resultado de responsabilidade política empresarial e compromisso público rigoroso entre governantes e governados.
Se todos estamos cansados de saber dos problemas brasileiros, agora é chegada a hora de resolvê-los! Para a efetividade da educação e da democracia, temos de extirpar a demagogia de nossa cultura política! Temos de nos engajar numa campanha cívica pelo controle social dos orçamentos da educação.
É chegada a hora de enfrentarmos nossa miséria política e superarmos os impasses da crise de gestão do setor público e da crise de valores do setor privado. Pois não é verdade que o povo brasileiro não presta. Não é verdade que não temos políticos em quem confiar. Não é verdade que somos individualistas e não sabemos agir em coletivo. Se ao menos alguns poucos políticos têm marcado seus mandatos com compromissos claros com a educação pública de qualidade, façamos deles os representantes maiores da cidadania mais ativa e consciente.
Reinventemos o estado democrático a partir de uma nova relação de representação baseada na prestação de contas de todos os mandatos. E usemos a mídia para celebrar, garantir e fiscalizar com firmeza este novo compromisso público. Podemos tolerar falhas e fracassos em qualquer outro campo da ação governamental, mas temos de eleger a educação como a marca inicial de uma revolução em nossos costumes políticos, o espaço de resgate da plena cidadania e o fim do jeitinho e da cultura de impunidade. O grande feito, enfim, de todos os cidadãos e não de um novo salvador-da-pátria, grão-provedor patriarcal, um novo "pai dos pobres" ou demagogo da vez!
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JORGE MARANHÃO é publicitário e diretor do Instituto de Cultura de Cidadania A Voz do Cidadão.
Jornal O Globo, 11/10/2007
Jornal O Globo, 11/10/2007
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